quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

Pois está Claro!

O espaço, para além de Claro, é simpático e acolhedor

Gostava de não levantar falsas expectativas, mas, pronto, cá vai: penso ter encontrado o melhor restaurante de Lisboa e arredores (... fica em Paço de Arcos). Será só entusiasmo, o entusiasmo da experiência que tive no “Claro!”? Sim, admito que pode ser. OK, não serei tão assertivo, até porque definir “o melhor” é sempre subjetivo. Portanto fico-me por “um dos melhores”. E sobre isso não cedo, venha quem vier. É que já há algum tempo não era posto à prova como neste restaurante, feito de uma cozinha intrinsecamente portuguesa, aparentemente simples e, no entanto, tão imaginativa e apelativa às sensações. Em Lisboa, talvez só nos inícios da “Bica do Sapato” e do “Assinatura” ou um pouco no atual “Bel Canto” tenha sentido tanta emoção com a sabedoria de um chef em conjugar texturas e sabores. Voltou a acontecer agora com Vítor Claro, o responsável por este espaço que baptizou com o próprio apelido.
O “Claro!” ocupa um espaço privilegiado no Hotel Solar Palmeiras, onde chegou a funcionar um “Cocagne” que nunca visitei. Mesmo em cima da marginal, em frente ao mar, a vista é, como se pode imaginar, magnifica. O interior não é tão vasto como a panorâmica, mas ainda bem. No bom tempo, é complementado por uma esplanada. Tudo muito bonito, mas é da cozinha que sai o melhor da casa. E a cozinha está a cargo do referido Vítor Claro. Não vou aqui fingir, como muitos dos meus colegas “aconselhadores” de restaurantes, que sou intimo do chef, que o conheço de ginjeira, que somos amigos do peito. Nada disso. Nunca o tinha visto. Mas já vi do que é capaz e pressenti nele uma paixão pelos pratos que depois se sente no paladar. Também li que percorreu as melhores cozinhas e aprendeu com os melhores cozinheiros. É tudo o que interessa saber. 
Mas vamos à comezaina. O restaurante funciona com menus compostos por vários pratos e, ao fim-de-semana, com um de cozido à portuguesa. Como fui num sábado, aconselharam-me o menu do cozido. Aceitei. Já a minha companheira quis amplificar a primeira experiência para provar o “menu do almoço”. Seguiu-se então um desfile de mimos gourmets fabulosos. Veio um pequeno prato (do menu do cozido) que dividimos. Uma fatia de presunto da beira baixa, outra de panceta e uma ameixa recheada com patê. Abriu o apetite. Depois, uma oferta extra menus, com o chef a fazer questão de experimentarmos o ex-libris da casa, o bacalhau à Conde da Guarda – uma espécie de pastel de bacalhau sem fritura, em dueto com tomate migado –, tão simples, mas tão saboroso que nos rendemos. E pronto, estávamos preparados para o banquete que incluiu raia em caldeta de ervas, caldo do cozido com foie gras, peixe do dia (seria salmonete?) acompanhado com cozido de grão e o cozido propriamente dito, um “cozido de autor”, com os componentes do tradicional, mas elevado a outro patamar. Só visto e só provado.
A boa notícia é que se come como rei a preço de plebeu. O menu do cozido custa 23 euros e o menu de almoço fica por 20 euros (prato principal), 22 euros (entrada ou sobremesa e prato principal) ou 24 euros (entrada, prato principal e sobremesa). A água e o café estão incluídos, bem como o pão, feito na casa, que é outra perdição, de tão quente e guloso. Ao jantar os preços crescem, tal como o banquete. Assim, o “menu de estação” composto por 6 pratos, fica em 35 euros, enquanto o “menu de degustação”, com 9 pratos, vai aos 60 euros. O vinho é à parte e há muito por onde escolher, mas há também boas sugestões diárias, todas a 3 euros o copo ou 13 euros a garrafa. Em nenhum outro local, com este nível, se praticam preços assim. Acreditem. L.M.

“Claro!”
Av. Marginal, Curva dos Pinheiros, Hotel Solar Palmeiras
2780-749 Paço de Arcos
Telefone – 214414231
Cartões – Aceita
Preço médio – 30 euros
Aberto todos os dias até às 22h30
Estacionamento – Privado

Notas (1 a 5)
Qualidade da refeição: 5
Serviço: 5
Preço: 5


quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

Dom Prego reina

No Dom Prego tem a possibilidade de comer ao ar livre
Quando quero uma refeição boa, barata e rápida, perto de casa, já sei o que escolher e onde ir. Vou ao D. Prego, na Parede.
Antes de haver “fast food”, os portugueses que queriam poupar dinheiro ou tempo (ou as duas coisas), optavam pelos populares “pregos” ou pelas “bifanas”, habitualmente servidos em carcaça. Só que, muitas vezes, havia desagradáveis surpresas: escondida entre o pão era colocada carne de qualidade duvidosa, cheia daqueles “nervos” irritantes. Havia, digo bem, porque, a partir de certa altura, o “prego” ganhou importância entre as nacionais opções gastronómicas e saltou para o prato, saindo reforçado nos acompanhamentos. E a carne passou a ser obrigatoriamente de boa qualidade, por se revelar em toda a sua plenitude.
No D. Prego (que antes foi Rui dos Pregos, casa nascida famosa lá para os lados do Cacém), a carne vem cortada muito fina e cobre praticamente o prato, a “molhanga” é um dos segredos e, apesar de não primar pela boa aparência, acreditem que dá ao petisco um paladar primoroso. A acompanhar, as obrigatórias batatas fritas (boas), pickles (muitos), azeitonas e ovo estrelado (opcional) – para além de muitos alhos esmagados, um “must”. Existe a versão do “prego” para crianças, que só traz a carninha, batatas e o ovo.
Com uma imperial (ou duas), a festa fica barata.
Se o fundo de maneio for mais avultado, podem abrir-se as hostilidades com um camarãozinho de Espinho, que na casa sai com frequência e é sempre fresco. Como foi o caso.
Enfim, por menos de dez euros/cabeça sai-se do D. Prego a reinar e com vontade de voltar. A.V.

DOM PREGO
Avenida da República, 1552 B
Parede (Cascais)
Telefone: 214570418
Cartões: aceita
Preço médio: 10 euros
Estacionamento: público (difícil)
Aberto todos os dias

Notas (1 a 5)
Qualidade da refeição: 4
Serviço: 4
Preço: 5




terça-feira, 3 de dezembro de 2013

Há de tudo como no mercado

As (poucas) mesas disponíveis não atrapalham o bom gourmet
Custou mas foi. A abertura do “novo” Mercado de Campo de Ourique foi uma saga que me deixou esgotado. No início do verão começaram a circular notícias de que no melhor bairro lisboeta (ok, sou suspeito por definir assim o sítio onde moro...) ia abrir uma série de quiosques com petiscos ao lado das bancas de produtos frescos (peixe, carne, legumes, frutas, entre outros) já existentes no local. E isto à imagem do famoso Mercado de San Miguel, em Madrid, este uma perdição de “tapeo” nas suas mais variadas e gloriosas formas. Assim, perante a perspetiva de ter tal coisa à mão de semear, cedo comecei a contar os dias até à inauguração. Mas foi duro. O verão passou e nada. A inauguração chegou a ser apontada para setembro, depois passou para meados de outubro, teve data marcada no início de novembro e só abriu, já perante a desconfiança geral, no dia 26 desse mesmo mês, o de novembro para quem já se perdeu. Mas valeu. Valeu a espera, a pena e valeu a aposta de quem teve a ideia, pois será rapidamente o “spot” mais concorrido de Lisboa, esperando que isso, entretanto, não o estrague.
            Quem conhece o irmão mais velho madrileno já sabe o que o espera. E não ficará desiludido, mesmo que sinta falta de algum “salero” que no outro se sente por todos os cantos. Seja como for, o “Mercado de Campo de Ourique” tem correspondido a todas as expectativas nestes poucos dias de pleno funcionamento. O bom gosto na decoração dos 16 quiosques (embora haja um, a “Pastelaria” que ainda não tem dono) é uma evidência, e a escolha do que cada um tem para oferecer foi acertada, ainda que possa haver desequilíbrios, sobretudo no desembaraço com que os clientes são servidos. A ideia é comprar os petiscos mais apreciados e ficar a degustá-los no balcão ou, mais difícil, nas mesas (poucas) existentes a meio do recinto. E, já agora, convém ir sem pressas ou cheio de impaciência. Nenhuma faz com que arranje lugar sentado ou que seja atendido mais depressa. Há que desfrutar deste local ímpar na capital, no melhor bairro do mundo (e, desta vez, não sou eu que o afirmo, é a insuspeita Monocle http://monocle.com/magazine/issues/68/).
            Ficam, então, as minhas primeiras impressões sobre cada espaço. E estas são sempre as decisivas, até porque, como dizia o outro, não há uma segunda oportunidade para causar uma boa primeira impressão...

Charcutaria Lisboa: Uma das “tasquinhas” mais concorridas, sobretudo por causa das travessas generosas de queijo, enchidos, pão e azeite, que servem um pequeno grupo a preços entre os 15 e os 30 euros.
Chef do Mercado: Petiscos de autor. Pode surpreender pela diferença. Supostamente também se dispõe a preparar pratos com produtos comprados no mercado, mas não vi o conceito em prática, nem me parece exequível com tanto movimento.
Hamburgueria U-Try: Bons hambúrgueres e umas batatas fritas, de pacote, a fazerem lembrar a infância, quando tudo tinha mais sabor. O problema é que, com aquela oferta à volta, arrisca-se a ter menos atenção.
Praça japonesa: Para quem estiver enjoado de petiscos portugueses, eis uma opção saudável de sushis e sashimis.
Petiscaria 2 à Esquina: Já existia na zona da Almirante Reis e abriu agora este segundo espaço. Petiscos óptimos como na casa original, mas um serviço “atrapalhado” ao contrário do que sucede na primeira. Se nada fizer, é um sério candidato ao prémio “vamos andar à toa quando isto apertar”.
Empaderia: Conceito já existente em diversos centros comerciais. Apesar disso, não deixa de ser interessante.
Joe’s Shack Menu: Um “americano” com tudo a que temos direito, desde chicken wings às BBQ Ribs. Também para desenjoar do petisco nacional.
Mercado do marisco: Marisco bom e relativamente barato. Com pratinhos de camarão, percebes, entre outras iguarias a puxar a cerveja. Complementa com uma champanheria que vende, para além do precioso líquido, umas ostras fresquissímas a 2 euros a unidade.
O Atalho: É, de longe, o mais procurado. A ideia é boa: grelhar carne que o cliente pode escolher da vitrina, tudo com uma boa apresentação final.
Gelati di chef: Gelados de autor, para completar a refeição.

Para além das tasquinhas de comida há as de bebida. Uma de vinhos (à garrafa ou a copo, mas com poucas escolhas), uma de cocktails (os diferentes gins são uma perdição...) e outra de cerveja, destacando-se esta pelos baldes cheios de gelo com cinco minis lá dentro, por apenas uma nota de 5 euros. Os preços baixos são, aliás, outro factor de atração, bem como a possibilidade de se poder petiscar fora do horário das refeições. L.M.

Mercado de Campo de Ourique
Rua Coelho da Rocha
1350-075 Lisboa
Telefone: 213962272
Cartões: aceita (também há multibanco no mercado e nas ruas adjacentes)
Preço médio: depende da escolha dos quiosques, mas petisca-se e bebe-se bem por 10 euros, e vai-se longe por 20. A partir daí, a festa é total.
Estacionamento: Difícil na rua, mas há um parque mesmo em frente, por baixo da igreja do Santo Condestável.
Aberto de domingo a quarta-feira até às 23h00 e de quinta-feira a sábado até à 1h00

Notas (1 a 5)
Qualidade da refeição: entre 3 e 4
Serviço: de 2 a 5
Preço: de 3 a 5

sexta-feira, 22 de novembro de 2013

O Faustino do Parque dos Poetas

A fachada do recomendável Faustino

Ali no eixo Paço de Arcos-Oeiras, muitas casas de comida adotam o nome do criador, o que facilita a sua referenciação, por não haver aquelas designações cheias de “nove horas”, extremamente confusas. Muitas vezes o nome até é grande, mas a qualidade curta…
Segundo reza a história, o Faustino - o sr. Faustino, já agora – dedicava-se às artes da pesca e decidiu abrir um negócio para partilhar com os clientes o excelente peixinho que apanhava. Mais tarde, o filho continuou a atividade e transformou o restaurante naquilo que é hoje, um local onde se come bem, mas se torna difícil ter mesa sem marcação, porque a clientela abunda.
Antes, podia dizer-se que a casa ficava no meio do nada, no cimo de Paço de Arcos, mas agora, com a finalização do Parque dos Poetas (autoria do autarca que “isaltinava” e atualmente ajuda a governar a partir da prisão), a zona até está a ficar bem supimpa.
A sala principal do Faustino é confortável, formal q.b., frequentada por pessoal das empresas da Quinta da Fonte à semana e famílias ao sábado.
Ali, o que vem do mar domina.
Para começar, uma sopa rica de peixe (12,90). Para quem gosta de partilhar, pode fazê-lo à vontade, a dose dá para dois pratos sem queixas quanto à quantidade. O conteúdo estava irrepreensível, com variedade na oferta, que incluía frutos do mar. Mas o caldo ainda era melhor, com o tempero certo. Mnham, mnham!
A seguir, pregado frito (10,90), prato que nem todos os restaurantes estão aptos a servir. Primeiro, há a dificuldade na compra do peixe ao fornecedor certo, depois o corte e a preparação, a seguir a fritura – tudo artes que o nosso Faustino domina. Comeu-se com prazer, mesmo aquelas pontas que algumas bocas mais esquisitinhas às vezes deixam de lado.
Mas como nem tudo é perfeito, houve um “pormenor”: o acompanhamento. A principal opção era a tradicional açorda, a alternativa o arroz de feijão. Como dispenso açorda, optei pelo arroz… que não satisfez inteiramente. Com peixe frito, decididamente, vai melhor o arroz de tomate.
Nada de grave, o Faustino está mais do que aprovado. As sobremesas ficaram para outra oportunidade, que era sexta-feira e o pessoal precisava de trabalhar à tarde. A.V.

O Faustino
Rua Gazeta de Oeiras, 88
2780-171 Oeiras
Telefone - 214 417 747
Cartões – aceita
Preço médio – 20 euros
Estacionamento – público (difícil)
Encerra aos domingos

Notas (1 a 5)
Qualidade da refeição – 4
Serviço – 4
Preço - 4

quinta-feira, 21 de novembro de 2013

Petiscar com style

Uma sala agradável e onde se apreciam bons petiscos

Tenho um problema com as “novas” casas de petiscos. Mas não me interpretem mal. Adoro o conceito. Aliás, lamentava quando praticamente não existiam em Lisboa. O problema é que se tornaram moda e, como qualquer moda, começa a enjoar quando em excesso (o mesmo diria das hamburguerias...). O pior é que, ao contrário do que indica a essência do nome, não se “petisca” na maioria destas casas, almoça-se ou janta-se. Petiscar, como se sabe, é a qualquer hora e muitas das chamadas tabernas “modernas” só abrem para as grandes refeições do dia. Apetece uma comezaina a meio da tarde? Então tenha-se um roteiro à mão para saber quais estão abertas. É que são poucas. E isso – mais o facto de muitas delas serem perfeitamente banais – tem feito com que me fosse afastando das mesmas.
Dito isto, foi com desconfiança que entrei no “Flores do Bairro”, o restaurante do Bairro Alto Hotel, na Praça de Camões, em Lisboa, que já passou por várias transformações até chegar ao ponto a que chegou: um espaço moderno, mas despretensioso, com uma carta onde se privilegia o petisco, embora com possibilidade de optar por pratos mais substanciais. Ao hotel já tinha ido várias vezes (e ficamos por aqui...), ao restaurante é que não. Mas em boa hora fiz a visita.
É que, ali, os petiscos são tratados com sabedoria e reinventados sem comprometer a receita tradicional. Os pratos de carne e de peixe chamavam a atenção, mas a aposta recaiu na secção “para picar”. Éramos dois e cada um escolheu outros tantos petiscos. Eu fui pela “açorda de lascas de bacalhau, pimento vermelho e ovo escalfado” (8 euros) e pelo “corridinho de ovos mexidos com croutons e lascas de presunto” (3,75). A companheira pelo “ceviche de corvina coentros e coco” (12,50) e pela “salada de polvo com pimentos e coentros” (7,50), mas ainda ali havia umas pataniscas, uns peixinhos da horta, uma morcela com maça, entre outros, que ficaram debaixo de olho e para a próxima. Sim, porque depois de experimentar as deliciosas iguarias que saíram daquela cozinha, haverá certamente uma próxima vez.
Um local muito interessante num bairro especial

A açorda de bacalhau, servida num pequeno pote preto, estava simplesmente divinal. Os ovos, que podem arruinar a carreira de um cozinheiro apesar de serem coisa simples, eram suculentos e realçavam um sabor que não consegui identificar. Já o coco anunciado no ceviche provocava dúvidas, mas acabou por resultar em pleno, dando ainda maior frescura à receita. A própria salada de polvo pouco prometia, mas também foi uma surpresa de tão boa e diferente do habitual.
Dois copos de vinho e mais duas sobremesas (excelentes os quatro) encareceram a refeição (os cafés, a preço de hotel – 2,50 euros – também ajudaram) que ficou em cerca de 60 euros. É caro, sim, mas tirando estes “extras” seriam menos 25 euros, ou seja, pode-se petiscar ali, e bem, por 35 euros o casal. Nada mau para restaurante de um dos hotéis mais requintados de Lisboa.

A repetir, sem dúvida, e com a possibilidade de, depois do “picanço”, subir ao último andar do Bairro Alto Hotel para tomar mais qualquer coisa numa das melhores esplanadas da capital. L.M.

Flores do Bairro
Praça Luís de Camões, 2,
1200-243 Lisboa
Telefone: 213408252
Cartões: sim
Preço médio: 25 euros
Almoço das 13h00 às 15h00 (tem “menu executivo” a 18,50 euros)
Jantar das 19h30 às 23h00
Estacionamento: há serviço de valet parking

Notas (1 a 5)
Qualidade da refeição: 4
Serviço: 4
Preço: 3

terça-feira, 19 de novembro de 2013

Um almoço feliz em Valência


Um local muito agradável para almoçar ao ar livre

Chegar a uma cidade desconhecida e encontrar um sítio para almoçar a sério não é uma tarefa fácil. Tenho alguns truques que me levam a falhar poucas vezes, mas desta vez até ia prevenido. Uma sugestão do Luís Milhano levava-me a antever uma tarde bem passada na chegada a Valência. Eis que os meus planos são atraiçoados com a vontade de conhecer o centro da cidade, a parte velha, a catedral, enfim, aquela coisa de turista que leva mais a sério o passeio do que a vertente gastronómica, algo que nunca entenderei.

Assim sendo, chegado ao dito centro, onde o passeio até foi agradável – é melhor dizer que sim, ou as consequências poderão ser imprevisíveis – a ideia era encontrar ali um local onde as nossas papilas gustativas não fossem traídas, que passear ainda aceitei, mas comer num franchise qualquer estava fora de questão. Passeando pelas ruelas da cidade velha e procurando um restaurante onde se percebessem a presença de famílias valencianas, eis que El Rall salta à vista. Uma esplanada despretensiosa, com poucos turistas e muitos espanhóis, visivelmente satisfeitos com os enormes tachos que tinham pela frente, falando alto e rindo sempre.

Fácil. Fiquei por ali. Convencida a companhia, eis que se nos oferece uma vasta lista, com a presença de vários produtos do mar, as inevitáveis paellas e muitos, muitos arrozes. A escolha foi simples, não sem antes deitarmos uma olhadela às mesas do lado e visível satisfação. Os mais felizes dividiam uma tachada de arroz caldoso e marisco e produtos do mar. Venha!

Antes, que o passeio tinha aberto o apetite, havia espaço para petiscar algo. Arriscámos croquetas caseiras, algumas tapas e um chouriço com batatas bravas. Começando por aqui, o enchido não deslumbrou mas também não comprometeu. Sabor forte e expressivo, mas sem deliciar. As batatas cumpriam a função, mas apenas isso. Nas tradicionais croquetas a primeira surpresa agradável. Pequenos pedaços de um saboroso presunto aliados a um recheio de exceção. Boa fritura. Cañas a escorregar. A tensão aumentava…

Com a chegada do tacho de arroz caldoso a perceção imediata de que estava perante algo especial. O cheiro e o aspeto dificilmente poderiam ser traídos pelo sabor. Não foram. Manjar tão requintado merecia um vinhito. Eis que chega o momento Monthy Piton da refeição, com um empregado que nos podia ter levado à loucura mas perante a excelência do que se nos oferecia só deu vontade de rir. Como diria o outro, no melhor pano cai a nódoa. Mas depois de muitas peripécias eis que chega o vinho, da casa e curiosamente também ele muito agradável. A terminar apenas cafés, que não havia espaço para mais, por muito que a crítica quisesse ser mais abrangente.
No final do jogo a vitória era incontestável...



El Rall é um restaurante recomendável. Sem grande sofisticação, mas ideal para comer um repasto a sério, num local muito aprazível e em boa companhia. O serviço não é mau. Manchado naquela tarde pelo responsável das bebidas, sim, mas não acredito que ainda pare por lá, tal o desajuste. Curiosamente, no triadvisor as críticas são bem diversas. Posso ter tido muita sorte, sim, mas confesso que lá voltarei sem hesitar.

El Rall
Calle Tundidores, 2
46001
Valencia, Espanha
Telefone - 0034 963922090
Cartões: sim.
Preço médio: 25 euros

Notas (1 a 5)
Qualidade da refeição: 4
Serviço: 3
Preço: 4



segunda-feira, 11 de novembro de 2013

Não é (só) mais uma Tendinha



Disse-me uma amiga que “A Tendinha”, no centro histórico de Oeiras, era uma tasca onde ela e alguns amigos bebiam umas cervejas nos idos de 80. Porque era barato, porque havia poucas alternativas e porque a localização dava jeito a todos. Mas nada a caracterizava especialmente, nem nessa altura, nem três décadas antes, quando abriu portas (1954). E, aos poucos, com as andanças da vida, foi caindo no esquecimento da amiga e dos amigos dela. Entretanto, não sei que transformação foi operada na “Tendinha”, mas o certo é que começou a aparecer nas páginas de jornais e revistas. E de uma forma tão elogiosa que surpreendeu essa tal amiga. Fomos então investigar...

À entrada senti logo que aquele local ia ser especial. O espaço é pequeno e acolhedor (28 lugares), mistura de restaurante, cervejaria e, sobretudo, tasca, e defino-o assim com toda a admiração. Mas há uma satisfação geral na cara dos comensais e um à vontade dos mesmos – não confundir com intimidade – que apetece logo experimentar. Não há menus encadernados, mas há ardósias na parede com as ofertas da casa. E as ofertas são variadas e podem ser surpreendentes para quem ainda não está familiarizado. A começar nas entradas que incluem ostras (!), amêijoas, percebes (quando os há), sapateiras e gambas, estas, frescas e rechonchudas, vendidas num pequeno prato por 5,50 euros, mesmo boas para partilhar e começar a despachar umas imperiais.


Depois, ao que parece, a malta vai ali comer bife, cuja fama é a de ser tenrinho. Um (9,75 euros) dá para dois, meia dose (8,75) para um. A última foi a minha escolha, apesar da diferença de apenas 1 euro. E, de facto, percebe-se a preferência geral, pois este bife distingue-se por ser verdadeiramente macio. O molho, com muito alho, dá-lhe um sabor extra e as batatas, bem fritas, amarelinhas, complementam-no na perfeição, tal como o ovo estrelado. Estou a escrever e já a salivar só de memória... Mas, atenção, esta não é a única (e boa) opção. Há, por exemplo, um excelente caril de gambas servido em casca de coco, tachinhos de arroz de tamboril, de polvo e de bacalhau (todos para duas pessoas ao preço de 14,50 euros), feijoada de gambas, massinha de peixe, polvo à lagareiro, entrecosto com amêijoas e por aí fora. Muito para escolher com a certeza de acertar sempre, pois tudo é bem confeccionado.

O vinho da casa, em jarro, é adequado ao espírito do local, pelo que é uma boa opção, embora haja outros disponíveis, de marca. O serviço é rápido e simpático. Quanto aos preços, são um pouco mais altos do que seria de esperar de uma tasca (repito, com toda a admiração pelo termo), mas também não se espera de uma tasca, que, no fundo, até é restaurante e cervejaria, refeições com tanta qualidade. Ainda assim, o almoço ou o jantar fica entre os 12 e os 15 euros, embora possa subir a mais de 20, caso se complemente a refeição com marisco. Dica para arranjar mesa: ao almoço é chegar logo pelas 12h30 ou a partir das 14h00. Ao jantar, reserve-se.


Tendinhas há muitas – uma pesquisa na net indica-nos várias pelo país –, mas esta, a de Oeiras, é especial e vale uma visita. Regada e demorada, de preferência. L.M.


 “A Tendinha”
Rua Rodrigues Freitas, 5
2780-293 Oeiras
Telefone – 212401739
Cartões – o multibanco “está avariado”
Preço médio: 15 euros
Aberto todos os dias até à meia-noite
Estacionamento – público


Notas (1 a 5)
Qualidade da refeição: 3
Serviço: 3
Preço: 4

quinta-feira, 7 de novembro de 2013

Desconcertante Xico


O Xico, em Paço de Arcos, tem um problema indecifrável, quando visto de fora: afinal, é o quê? Café? Pastelaria? Restaurante? Cervejaria?

Bom, apesar do pretensiosismo, o Xico pode ser isso tudo, porque está dividido em várias salas, onde os ambientes se cruzam. Para quem lá entra pela primeira vez será mais uma cervejaria descontraída, mas, observada a carta, com pratos tipicamente portugueses, não há dúvida, trata-se de um restaurante. Confusos? Também eu!


As opções são muitas e, de acordo com os padrões mais populares, contemplam doses e meias-doses (aqui para nós... chegam perfeitamente). Como íamos à procura de carne, a escolha do dia foi óbvia: cabrito à padeiro e leitão, este por ter sido assado na casa, iniciativa que diz bem da ambição do Xico.


Vamos por partes. O cabrito era tenro, o que se revelou um trunfo poderoso; o arroz de miúdos estava solto e as batatas consistentes, com aquela cor que não engana: tinham passado o tempo certo no tabuleiro de barro. Benditos 11 euros!


Quanto ao leitão, a conversa mudou de figura. Assá-lo não é decididamente para todos. Nem mesmo para o Xico de Paço de Arcos. A partir do momento em que a pele não vem estaladiça está tudo estragado. Quem me manda a mim arriscar no leitão fora da Mealhada?!
Resumindo: em frente à Escola Náutica, come-se um belo cabrito à padeiro. O resto faz de conta que não aconteceu. A.V.


Café O Xico

Av. Eng. Boneville Franco, 18
2780-567 Paço de Arcos
Telefone - 214434786
Cartões - aceita
Preço médio: 17 euros
Encerra às terças
Estacionamento - público


Notas (1 a 5)

Qualidade da refeição: 3
Serviço: 4
Preço: 3







sexta-feira, 1 de novembro de 2013

Um regresso feliz



Nunca percebi o sentido da frase “não se deve voltar ao lugar onde se foi feliz”. Por mim, volto sempre que posso. Pois se fui feliz, quero continuar a sê-lo. Se ficar desiludido, então pronto, não volto e fica o assunto arrumado. E foi com base nesta filosofia que, um dia destes, deu-me saudades e regressei a um restaurante onde tenho sido muito feliz. O “Laurentina, o Rei do Bacalhau”, ali para as Avenidas Novas, em Lisboa.

Quando lá cheguei, a primeira surpresa. O espaço foi remodelado. E com bom gosto. A antiga decoração não era particularmente atractiva – nem rústica, nem moderna, um híbrido sem muito para dizer. Coisa que, aliás, pouco importava, pois a ideia era apreciar o bacalhau (peixe que ali é tratado de todas as maneiras e feitios) e não a decoração. O restaurante, agora, está diferente. Está mais distinto, sem perder a identidade. Tem prateleiras em madeira, com fotos antigas e artefactos rurais, tem cadeiras confortáveis de design, tem candeeiros modernos. Enfim, está feito um restaurante para o futuro, ele que existe desde 1976.

Mas vamos ao que interessa. Depois de uns brilhantes pastéis de bacalhau – o prato de presunto também pede atenção, mas o melhor é ficar pelo ex-libris da casa – há que fazer a escolha. E, entre o à Braz, o lascado, o à Laurentina, o cozido, o com natas, etc, etc, a minha preferência vai sempre para a... Couvada de Bacalhau. E, neste regresso, mantive-me fiel. Uma bela posta do também fiel bacalhau, por cima de couve e batatas, todos cozinhados e embebidos num azeite delicioso, a pedir que se molhe o pão, igualmente excelente, quentinho e crocante. Uma maravilha.

Pena fiquei por a minha companheira e eu concordarmos com a sugestão de uma empregada que, muito atenciosa e simpaticamente, sugeriu meia dose de couvada para dois, pois uma dose serve três pessoas. Talvez tenha razão, mas esta dupla é de alimento e aquela meia dose só satisfaz os menos “gulosos”. Ao lado, outro par agradeceu a dica, mas não foi na conversa e era vê-lo, deliciado, a arrasar uma dose interinha. Só para os dois. Devíamos ter feito o mesmo. Para a próxima já sabemos.

O preço, com meia garrafa de vinho, uma sobremesa e café ficou em pouco mais de 20 euros por pessoa. Valor que seria maior no caso de ter optado por uma dose, mas que não deverá chegar aos 30 euros por cabeça. Isto (ainda) mais bem alimentado e mais bem bebido. Como esperava, foi um regresso que me deixou feliz e com vontade de repetir. L.M.


Laurentina – O Rei do Bacalhau
Avenida Conde Valbom, 71 A 1050-067 Lisboa
Email: info@restaurantelaurentina.com
Preço médio: 25 euros
Telefone: (+351) 217 960 260
Cartões: aceita
Aberto todos os dias, excepto a 25 de dezembro
Nota: Duas horas de estacionamento nos parques Valbom, Berna e La Machina (a 10 metros).


Notas (1 a 5)
Qualidade da refeição: 4
Serviço: 4
Preço: 3


quinta-feira, 31 de outubro de 2013

Olha que bela cozinha em Barcelona

Sim, é verdade que fica em Barcelona, uma cidade onde é difícil não passear bem-disposto, mas quando se chega ao Cuines Santa Catarina percebe-se que se está perante algo especial. Porque brilha. Porque tem vida. Porque tem gente à espera. Porque não são só turistas. Porque na sua maioria são mesmo espanhóis, por muito que alguns não queiram. Por fim, porque o sítio é bonito, bem frequentado e arejado sem ser nenhuma das coisas em demasia.

Atacado por um bichinho qualquer que não me deixou fazer a refeição desejada, mas antes participar depenicando aqui e ali (sei que o Milhano não gosta do termo, mas foi realmente o que aconteceu e por isso não mereço castigo), tive uma tarde de luxo ali ao lado do mercado de Santa Catarina, onde se situa o local do crime.

Recebidos com um sorriso nos lábios, chegam primeiro umas imperiais e uma água… que a vida é assim. As loiras chegavam em copos dos que levam a cerveja a sério e escorregaram rapidamente. Na hora de pedir, perante tanta variedade a escolha tornou-se mais complicada. Ainda assim, após aturado debate, eis que se mandam vir uns mexilhões ao natural (11 euros), uns Huevos com Foie (13.60) e um arroz montanhês (17).
A espera não foi muita e as cañas e o belo pão colocado na mesa ajudaram o pouco tempo a passar. À chegada, os mexilhões apresentaram-se frescos, generosos, equilibrados. Apenas algum alho e ervas davam o toque de classe a bichinhos de primeira qualidade.

Os ovos com Foie-gras surpreenderam. O prato mais “gourmet-nouvelle cuisine” da refeição, tanto na apresentação como na quantidade, mas com sabor a cozinha real. Simples e bonito. Bom de provar. Para quem não gosta muito de arriscar uma excelente escolha.

O arroz montanhês mereceu mais estrelas. Com frango, salsicha e cogumelos (pollo, botifarra e setas) chegou no ponto. Saboroso, bem apresentado, feito na hora para quem o pede. Bom, ficou a sensação de que nos muitos que abundam na lista ainda haverá melhores tendo em conta os ingredientes.


Como a fome já não era muita evitaram-se as sobremesas. No entanto, ao passar por nós um prato lindo de Jamon Ibérico, eis que somos obrigados a pedir um igual (17 euros). Ah, dinheiro bem gasto. Para culminar a vergonha, a oferta de um copo de tinto para degustar com o presunto. A vida é tão simples quando passada em boa companhia e melhores mesas. B.R.

Cuines de Santa Caterina
Mercado de Santa Caterina, Barcelona
Avinguda de Francesc Cambó, 20
Telf: +34 93 2689918
e-mail: cuinessantacaterina@grupotragaluz.com
Cartões: aceita
Preço médio: 25 euros


Notas (1 a 5)
Qualidade da refeição: 4
Serviço: 4
Preço: 4


quarta-feira, 23 de outubro de 2013

É tempo de salmonetes


Aprendi em Setúbal que os salmonetes devem comer-se quando a sardinha já não é boa. Meses sem “r” são os da sardinha, com ele reinam os salmonetes. Estando em outubro é mais do que tempo de os provar.

Para não haver surpresas a escolha foi óbvia, o Mar do Inferno, ali onde começa a rota dos restaurantes selectos da estrada do Guincho, mas cujos preços não pegam fogo no bolso.
O local é despretensioso, sem luxos, o serviço despachado (às vezes esquecido). Nele estão reunidas as condições para uma jornada gastronómica à maneira.

Para começar vieram uns percebes da Roca. Suculentos, impecáveis. Acrescentar mais comentários seria estragar.

Depois apresentaram-se os salmonetes. Boas notícias: quem estava na grelha sabia exatamente o que fazer e assim que a faca levantou a pele do peixinho, esta saltou integralmente, sinal de frescura e qualidade. A partir daí foi fruir “aquele” sabor (estão a ver, “aquele”…). As batatas com pele e os legumes salteados estiveram à altura.

A minha companhia escolheu lulas, que, disse, estavam um pouco rijas. Problema dela. Os 
meus salmonetes estavam ótimos.


Para rematar, um café medíocre da Lavazza. Ou a máquina não estava afinada ou o lote era fraco. Que a gerência resolva o problema, fiquei com vontade de voltar depressa. A.V.


Restaurante Mar do Inferno
Av. Rei Humberto II de Itália
2750-642 CASCAIS
Telefone: 214 832 218
Email: marinferno@netcabo.pt
Estacionamento: tem
Cartões: aceita
Encerra às quartas-feiras
Preço médio: 30 euros

Notas (1 a 5)
Qualidade da refeição: 4
Serviço: 4
Preço: 3



terça-feira, 8 de outubro de 2013

Uma nova aventura

Portugal tem a cozinha mais criativa (!) do Mundo - na verdade isto quer dizer que historicamente sempre se fizeram grandes petiscos com pouco. Os portugueses adoram comer e, ao contrário do que sucede com indígenas de outras latitudes pouco aconselháveis, não acham que seja a almofada a melhor conselheira, está na mesa e no copo o segredo para as grandes decisões. É por isso mais do que normal existirem tascas, restaurantes, leitarias que servem bitoques, modernos bistros, pastelarias e "senequebares" com pretensões gourmet de norte a sul do país. Com tanta clientela, todos se safam, mas nem todos são bons. Pelo contrário.

Tem de haver pois alguém que ponha ordem nisto, na desordem que é a carta gastronomica nacional, onde muitos andam à boleia dos verdadeiramente bons. E nós somos as autoridades.